Até lá.

Posted: 24/04/2009 in Intervenção
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A tarefa dos homens com consciência política consiste em convencer os governantes a operar reformas políticas, sociais e económicas, acreditando eu que os diferentes tipos de intervencionismo económico do estado não podem resolver a disputa nascida da apropriação de parcelas dos recursos do planeta e da especialização do trabalho, pois também eles serão desigualmente apropriados. As experiências intervencionistas realizadas pelos estados alemão e americano na década de trinta do século vinte, tiveram resultados medíocres, refutaram as teorias económicas dominantes na época e terminaram com um recontro global, pouco depois de terem saído de outro. As reformas a introduzir, que serão sempre formas de intervencionismo, terão de ser globalmente pensadas de modo a não conduzirem a um novo confronto entre grupos de interesses agregados a países ou nações. A guerra é, e será sempre, destruição e sofrimento.

A ideologia liberal que do ponto de vista ético, ao defender a liberdade individual face a um poder totalitário do estado, parece estimular a felicidade e o bem, não se revelou, historicamente, tão eficaz na promoção da justiça social. Foram gastos muitos séculos na crença de que o progresso económico e a liberdade só seriam possíveis se fundados na defesa do direito à propriedade privada e na não limitação da sua posse. Esta crença não se afigura de forma alguma verdadeira. A não limitação da posse e a apropriação sem limites dos escassos recursos, não parece ser condição de liberdade nem de progresso económico, podendo ser mesmo fonte de alienação e infelicidade e a causa da desumanização do homem. Todavia, assim parece que continuará a ser no futuro, se não se fizer algo para o atenuar e se não acontecer uma coincidência entre a necessidade de realizar reformas sociais, que tenham como horizonte a correcção das desigualdades sociais criadas pela apropriação do que era comum, com uma prática disposta a executar essas reformas, pois, se excluirmos duas ou três grandes revoluções que se diluíram nos séculos, temos constantemente assistido a anúncios de grandes reformas pelos governantes que se têm seguido uns aos outros e que não tiveram qualquer tradução prática, a não ser a de entreterem, distraírem, iludirem, embalarem e alienarem. Acredito que, sendo o homem um ser racional, as mudanças devem ser implementadas de forma pacífica e negociada. Porém, o homem não é só razão, ele é sobretudo interesse, daí que outras formas de implementar as mudanças não sejam de excluir, contudo não me parece que contribuam para o progresso social do homem, uma vez que ficam muito dependentes dos caprichos, dos interesses de quem as conduz.

Se, no passado, a oposição social se fez primeiro entre senhores e escravos, depois entre capitalistas e operários e sempre entre exploradores e explorados, e pode ser que assim continue a ser em algum sítio do planeta, no mundo ocidental desenvolvido, o grande confronto social faz-se entre contribuintes e beneficiários, entre Uns e Outros. Não nos damos conta deste confronto porque os pagantes não se sentem, nem são vistos como oprimidos, nem os favorecidos se sentem, nem são vistos como opressores. Pelo contrário, os beneficiários são vistos como os excluídos e os contribuintes como os privilegiados porque têm trabalho. Uns compram uma aparente harmonia social, os Outros vendem-na. Uns e Outros são cúmplices das desigualdades e do mal-estar social e não parecem interessados em mudar o que quer que seja. A cíclica, senão mesmo a permanente crise económica faz crescer o desemprego e o pauperismo, pelo que é necessário manter uma enorme massa de pessoas sem fazer nada. Quem mantém todo este exército de desocupados e todos os outros que por outras razões se lhe juntam? Os que vivendo de rendimentos pagam impostos, os que vivendo do trabalho pagam impostos e os que vivendo do trabalho não pagam impostos, por isso mesmo, não auferem de um rendimento que lhes permite convergir quer em lazer, quer em trabalho.

 É, portanto, necessário convencer os que têm por missão a condução do futuro que Todos devem contribuir para o bem comum e, para isso, sustento, pelo menos numa primeira impressão, e uma vez que ainda não enterrámos o cadáver do trabalho, que Uns e Outros devem participar do trabalho que constrói os bens de que usufruem. Todos devem trabalhar, excluo, é claro, as crianças, os adolescentes e todos aqueles que já o fizeram por muitos anos, e por isso mesmo, ganharam o direito ao descanso, bem como aqueles que, por infortúnio, não o podem fazer. Porque o trabalho deve ser dignificante não se poderá estender por muitas horas e a forma de o tornar universal, numa época em que ele é escasso, é diminuir o tempo a ele aplicado. Por via dos ganhos de produtividade e da aplicação de novas tecnologias, o mesmo é dizer que o investimento será sempre insuficiente, ele será cada vez mais escasso. Torna-se, assim, urgente diminuir as horas dedicadas ao labor para que ninguém seja isento da sua rotina. Na idealização de uma sociedade utópica, houve quem propusesse seis horas por dia, embora eu pense que poderão ser ainda menos. Esta, afigura-se-me ser uma meta nada utópica e que não coloca em causa o direito, que alguns vêem como natural, à propriedade, mesmo a dos meios de produção, a não ser pela falta de vontade prática para a tornar real.

Até lá, teremos Todos de viver assim.

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